14 de abril de 2015
Jardins impõem preservação das zonas residenciais à prefeitura
Comentário SAAP: Representantes da SAAP participaram do debate sobre zoneamento promovido pela AME Jardins na semana passada. Com a presença de vereadores e o secretário de Desenvolvimento Urbano, o objetivo do encontro era a defesa das zonas residenciais.
Fonte: Gazeta de Pinheiros, 10/04/2015
Zoneamento proposto pela administração municipal prevê flexibilização do comércio; moradores são contra
Moradores dos Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano promoveram na última terça-feira (7) um debate sobre a nova lei de zoneamento (Lei de Uso e Ocupação do Solo). O encontro, com cinco horas de duração, foi realizado no auditório do Museu Brasileiro da Escultura (Mube) e teve como ponto principal a reafirmação da sociedade local quanto à proteção das áreas residenciais.
A discussão contou com a presença do secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Fernando de Mello Franco, de vereadores e urbanistas críticos às medidas planejadas pela administração paulistana.
Para acompanhar o debate, mais de 300 pessoas compareceram ao auditório do Mube, com capacidade para 198 espectadores. “Eu posso dizer que tivemos aqui um divisor de águas. É uma mudança muito significativa, que não pode, única e exclusivamente, ser alterada por uma lei, sem que as pessoas diretamente relacionadas a essas mudanças se manifestem e tragam as suas opiniões”, destacou Fernando José da Costa, presidente da Ame Jardins (Associação de Moradores e Empresários dos Jardins), entidade que coordenou o evento.
O projeto da nova lei de zoneamento, que deve ser enviado à Câmara Municipal até o final de maio pela gestão Fernando Haddad, propõe a criação de corredores comerciais em vias no entorno dos Jardins, classificados como Zonas Estritamente Residenciais (ZERs). As avenidas Brasil, Europa e 9 de Julho, além das ruas Groelândia e Estados Unidos, são passíveis de mudança no perfil urbanístico. Nestes locais já funcionam estabelecimentos comerciais de baixo impacto.
Porém, caso a proposta do Executivo seja aprovada pelos vereadores nos moldes atuais serão liberadas atividades como restaurantes e supermercados, sem limite para horário de funcionamento e que devem atrair um público constante à região. Para os moradores, este cenário pode aumentar o tráfego de veículos e as áreas construídas, descaracterizando os bairros planejados pela Companhia City no início do século 20.
Ainda de acordo com a proposta em elaboração pela Prefeitura de São Paulo, parte dos bairros residenciais seria convertida em Zonas Predominantemente Residenciais (ZPRs), com novas atividades de comércio. Outro instrumento do projeto que deve alterar a configuração residencial dos Jardins é a Zona Corredor (ZCor), planejada para vias que cortam as ZERs, caso da Rua Sampaio Vidal.
A criação da Zona Eixo de Estruturação da Transformação Urbana (ZEUs), onde a gestão Haddad pretende incentivar o adensamento, será implantada em áreas vizinhas a quarteirões residenciais, sem zona de transição para reduzir os impactos. Neste caso, enquadra-se a Rua Estados Unidos, onde um edifício em construção é alvo de crítica dos moradores que compareceram ao debate no Mube. Um abaixo-assinado em forma de protesto foi entregue em mãos aos representantes da Prefeitura.
Contestações
A proposta da Prefeitura tem a intenção de regulamentar o comércio em vias de trânsito intenso, onde já funcionam alguns estabelecimentos em desconformidade com o atual zoneamento, estabelecido em 2004. Entre os endereços com esta característica está a Alameda Gabriel Monteiro da Silva, com diferentes perfis de lojas e pontos de serviços.
Para os moradores, é quase um consenso de que esta flexibilidade pode ser perigosa para o futuro dos Jardins. “A permissão do comércio no zoneamento pretendido vai ‘comer pelas beiradas’ as zonas residenciais”, afirmou no evento a arquiteta e urbanista Regina Monteira, convidada para o debate pela Ame Jardins.
Argumento semelhante foi apresentado pelo integrante do Conselho Municipal de Política Urbana, Sérgio Reze. “Se quisermos preservar de verdade a ZER, precisamos implantar as zonas de transição. O efeito de ‘borda’, fará o bairro perecer, pois os moradores não vão querer mais ficar ali. Precisamos ser realistas e ter maior abertura sobre o detalhamento final de cada corredor”, disse ele, morador do Parque da Previdência, região do Butantã.
Regina Monteiro também destacou que os Jardins prestam um serviço ambiental à metrópole. “A diferença de temperatura entre bairros arborizados e adensados chegar a ser de 10 ºC”, disse a urbanista. “Por isso, acredito que o modelo de ZER não deve sofrer alterações, mas ser incentivado na cidade”, completou ela, ao exibir imagens aéreas dos Jardins em contraste com o bairros edificados do entorno.
Por sua vez, a urbanista e diretora executiva do Movimento Defenda São Paulo, Lucila Lacreta, buscou destacar possíveis incoerências do projeto em relação à configuração legal dos bairros residenciais. “As regras de fundação dos bairros-jardins foram registradas e aprovadas pela Prefeitura há cem anos. O que desejamos como cidadãos é termos os nossos bairros planejados”, declarou. Para ilustrar suas argumentações, recorreu a um vídeo no qual o atual ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, defendia direitos adquiridos pelos moradores, que segundo ela, são ignorados pela gestão Fernando Haddad.
Outra crítica quanto ao projeto da Prefeitura é referente à rapidez do processo de discussão. Também houve queixas a respeito da baixa adesão de propostas entregues pelos moradores ao longo das oficinas e audiências públicas realizadas antes do Plano Diretor Estratégico, aprovado no ano passado e que definiu as diretrizes da lei de zoneamento.
Presente no evento, o vereador Andrea Matarazzo (PSDB) afirmou que os moradores locais temem que a região deteriore com a regularização do comércio. “Quando fui secretário [Coordenação das Subprefeituras] fechei lojas e derrubei prédios, coisas desagradáveis. Sei que é mais fácil mudar a lei e premiar os picaretas, punindo aqueles que estão dentro da lei”, disse o parlamentar, que também é morador dos Jardins.
Resposta
Após a exposição dos urbanistas críticos à lei de zoneamento, o secretário de Desenvolvimento Urbano justificou as propostas de adensamento e ampliação do comércio. “O Município precisa se reorganizar, pois os dados geográficos apontam para um aumento na expectativa de vida dos cidadãos, com um futuro déficit habitacional de 770 mil moradias nos próximos 16 anos. Fundamentalmente, somos solidários ao pleito e à causa de vocês, de manutenção da qualidade morfológica, paisagística, da memória de bairro, alguns dos quais tombados e que, em hipótese alguma, podem ser alterados”, afirmou Fernando de Mello Franco, que disse ter vivido a infância jogando bola nos Jardins.
“Para pensarmos as ZERs, precisamos pensar a necessidade da cidade também acolher transformações. Mas esse é, de uma forma bastante genérica, o objetivo daquilo que constitui o conjunto das peças que integram o marco regulatório da política urbana”, finalizou o secretário, que durante todo o evento foi acuado pelos moradores.
Quanto à valorização ambiental dos Jardins, o secretário afirmou que o adensamento previsto pelo Plano Diretor Estratégico, que estabelece as diretrizes do zoneamento, tem o objetivo de conter o avanço da mancha urbana para as extremidades da metrópole. “Qualquer nova construção irá avançar sobre as áreas muito frágeis nas franjas urbanas do território, onde estão os nossos mananciais o que pode agravar a crise atual”, apontou Fernando de Mello Franco.
Junto a Fernando de Mello Franco esteve o diretor do Departamento de Uso do Solo, Daniel Montandon, que rebateu as críticas quanto ao processo de discussão e transparência do projeto. “São realizadas audiências públicas e temos ferramentas digitais disponíveis para consulta na internet”, disse.
Também estiveram presentes no debate o engenheiro Ivan Maglio e os vereadores Police Neto (PSD), Aurélio Nomura (PSDB), Paulo Frange (PTB) e Gilson Barreto (PSDB), além do secretário municipal de Direitos Humanos, Eduardo Suplicy, que compareceu na condição de morador e apoia a causa dos Jardins. Da parte da sociedade civil se apresentaram integrantes de associações de diferentes bairros da região de Pinheiros e das zonas norte, sul, oeste e do centro da cidade.
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